terça-feira, 8 de setembro de 2015

Onde tudo começou

Corre erê!
São Cosme e Damião chegou.
Mas desce pra ver
Mais um filho seu se batizou.

Um abraço acolhedor
Tão forte quanto um sorriso encantador
Perdi o medo, ganhei a fé
São muitas forças que mantem de pé (2x)

E o povo da rua se enfileirou
Trazendo axé e muito amor
Vovó preta me chamou
Foi quando adorei as almas que tudo clareou

Clareou, Clareou
Clareou, o meu caminho iluminou

Corre erê!
São Cosme e Damião chegou.(2x)
Perdi o medo, ganhei a fé
São muitas forças que mantem de pé (2x)

De longe ja escuto o som do tambor
Vejo o brilho da mesa enfeitada
Pode sorrir sim senhor
Porque hoje é dia de Oni Beijada

Salve Folhinha, Rosinha, Mariazinha
Salve os Erês, doum, dois-dois
Salve Raio de Sol brincando de trem
Taca fogo no mato que ele vem!

Depois

Tanto que eu flutuei
Quanto avião de papel
Da sua terra eu era rei
Voando rasante no céu

Pontes traçadas por mim
Choros do meu cavaquinho
Quatro estradas pro fim
Cinco pra dar o caminho

Depois de beijar, vem temer
Depois do desejo, paixão
Depois de amar vem o que?
Depois de sonhar, vem o chão

Giro nesse carrossel
O tempo não para, amor
Volto no mesmo pincel
Azul da infância de cor

Olhos falantes de lá
Dedos cantantes daqui
Voz no futuro a escoar
Faz-te parar pra ouvir

Depois de secar, vem chover
Depois do silêncio, canção
Depois de amar vem o que?
Depos de partir, vem perdão



Por Matheus Candal.

segunda-feira, 8 de junho de 2015

Onde?

Quando posso esta tarde,
Quando queres é porque arde.
Oh, chama! Flameja minha insana busca
Altruísta de inspiração única.

Mas também de medos,
Apegos e receios.
Quando choro é porque creio,
Estar vivo onde a vida já não habita mais.
Difícil é perder a vontade de querer
E ser aquele que faz.

Ativo, ouvindo.
Passivo, refletindo.
Abro caminho, destruo cadeados:
Sou aquele mesmo moleque dos pés descalços.

Aquele que  caiu e levantou;
Que perdeu e reconquistou;
Que teve medo e se encorajou;
Que viu em meio ao ódio um caminho até o amor.

Não sou doutor, não sou poeta.
Não sou artista, não sou profeta.
Sou apenas aquele que tenta e erra,
Aquele em que a mira se eleva.

Cada vez mais alto.
Cada vez mais longe.
Cada vez mais perto
Do meu tão sonhado onde.

segunda-feira, 1 de junho de 2015

Tabacaria

Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.
Janelas do meu quarto,
Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é
(E se soubessem quem é, o que saberiam?),
Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,
Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa,
Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres,
Com a morte a por umidade nas paredes e cabelos brancos nos homens,
Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.
Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade.
Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer,
E não tivesse mais irmandade com as coisas
Senão uma despedida, tornando-se esta casa e este lado da rua
A fileira de carruagens de um comboio, e uma partida apitada
De dentro da minha cabeça,
E uma sacudidela dos meus nervos e um ranger de ossos na ida.
Estou hoje perplexo, como quem pensou e achou e esqueceu.
Estou hoje dividido entre a lealdade que devo
À Tabacaria do outro lado da rua, como coisa real por fora,
E à sensação de que tudo é sonho, como coisa real por dentro.
Falhei em tudo.
Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada.
A aprendizagem que me deram,
Desci dela pela janela das traseiras da casa.
Fui até ao campo com grandes propósitos.
Mas lá encontrei só ervas e árvores,
E quando havia gente era igual à outra.
Saio da janela, sento-me numa cadeira. Em que hei de pensar?
Que sei eu do que serei, eu que não sei o que sou?
Ser o que penso? Mas penso tanta coisa!
E há tantos que pensam ser a mesma coisa que não pode haver tantos!
Gênio? Neste momento
Cem mil cérebros se concebem em sonho gênios como eu,
E a história não marcará, quem sabe?, nem um,
Nem haverá senão estrume de tantas conquistas futuras.
Não, não creio em mim.
Em todos os manicômios há doidos malucos com tantas certezas!
Eu, que não tenho nenhuma certeza, sou mais certo ou menos certo?
Não, nem em mim...
Em quantas mansardas e não-mansardas do mundo
Não estão nesta hora gênios-para-si-mesmos sonhando?
Quantas aspirações altas e nobres e lúcidas -
Sim, verdadeiramente altas e nobres e lúcidas -,
E quem sabe se realizáveis,
Nunca verão a luz do sol real nem acharão ouvidos de gente?
O mundo é para quem nasce para o conquistar
E não para quem sonha que pode conquistá-lo, ainda que tenha razão.
Tenho sonhado mais que o que Napoleão fez.
Tenho apertado ao peito hipotético mais humanidades do que Cristo,
Tenho feito filosofias em segredo que nenhum Kant escreveu.
Mas sou, e talvez serei sempre, o da mansarda,
Ainda que não more nela;
Serei sempre o que não nasceu para isso;
Serei sempre só o que tinha qualidades;
Serei sempre o que esperou que lhe abrissem a porta ao pé de uma parede sem porta,
E cantou a cantiga do Infinito numa capoeira,
E ouviu a voz de Deus num poço tapado.
Crer em mim? Não, nem em nada.
Derrame-me a Natureza sobre a cabeça ardente
O seu sol, a sua chava, o vento que me acha o cabelo,
E o resto que venha se vier, ou tiver que vir, ou não venha.
Escravos cardíacos das estrelas,
Conquistamos todo o mundo antes de nos levantar da cama;
Mas acordamos e ele é opaco,
Levantamo-nos e ele é alheio,
Saímos de casa e ele é a terra inteira,
Mais o sistema solar e a Via Láctea e o Indefinido.
(Come chocolates, pequena;
Come chocolates!
Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates.
Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria.
Come, pequena suja, come!
Pudesse eu comer chocolates com a mesma verdade com que comes!
Mas eu penso e, ao tirar o papel de prata, que é de folha de estanho,
Deito tudo para o chão, como tenho deitado a vida.)
Mas ao menos fica da amargura do que nunca serei
A caligrafia rápida destes versos,
Pórtico partido para o Impossível.
Mas ao menos consagro a mim mesmo um desprezo sem lágrimas,
Nobre ao menos no gesto largo com que atiro
A roupa suja que sou, em rol, pra o decurso das coisas,
E fico em casa sem camisa.
(Tu que consolas, que não existes e por isso consolas,
Ou deusa grega, concebida como estátua que fosse viva,
Ou patrícia romana, impossivelmente nobre e nefasta,
Ou princesa de trovadores, gentilíssima e colorida,
Ou marquesa do século dezoito, decotada e longínqua,
Ou cocote célebre do tempo dos nossos pais,
Ou não sei quê moderno - não concebo bem o quê -
Tudo isso, seja o que for, que sejas, se pode inspirar que inspire!
Meu coração é um balde despejado.
Como os que invocam espíritos invocam espíritos invoco
A mim mesmo e não encontro nada.
Chego à janela e vejo a rua com uma nitidez absoluta.
Vejo as lojas, vejo os passeios, vejo os carros que passam,
Vejo os entes vivos vestidos que se cruzam,
Vejo os cães que também existem,
E tudo isto me pesa como uma condenação ao degredo,
E tudo isto é estrangeiro, como tudo.)
Vivi, estudei, amei e até cri,
E hoje não há mendigo que eu não inveje só por não ser eu.
Olho a cada um os andrajos e as chagas e a mentira,
E penso: talvez nunca vivesses nem estudasses nem amasses nem cresses
(Porque é possível fazer a realidade de tudo isso sem fazer nada disso);
Talvez tenhas existido apenas, como um lagarto a quem cortam o rabo
E que é rabo para aquém do lagarto remexidamente
Fiz de mim o que não soube
E o que podia fazer de mim não o fiz.
O dominó que vesti era errado.
Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando quis tirar a máscara,
Estava pegada à cara.
Quando a tirei e me vi ao espelho,
Já tinha envelhecido.
Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado.
Deitei fora a máscara e dormi no vestiário
Como um cão tolerado pela gerência
Por ser inofensivo
E vou escrever esta história para provar que sou sublime.
Essência musical dos meus versos inúteis,
Quem me dera encontrar-me como coisa que eu fizesse,
E não ficasse sempre defronte da Tabacaria de defronte,
Calcando aos pés a consciência de estar existindo,
Como um tapete em que um bêbado tropeça
Ou um capacho que os ciganos roubaram e não valia nada.
Mas o Dono da Tabacaria chegou à porta e ficou à porta.
Olho-o com o deconforto da cabeça mal voltada
E com o desconforto da alma mal-entendendo.
Ele morrerá e eu morrerei.
Ele deixará a tabuleta, eu deixarei os versos.
A certa altura morrerá a tabuleta também, os versos também.
Depois de certa altura morrerá a rua onde esteve a tabuleta,
E a língua em que foram escritos os versos.
Morrerá depois o planeta girante em que tudo isto se deu.
Em outros satélites de outros sistemas qualquer coisa como gente
Continuará fazendo coisas como versos e vivendo por baixo de coisas como tabuletas,
Sempre uma coisa defronte da outra,
Sempre uma coisa tão inútil como a outra,
Sempre o impossível tão estúpido como o real,
Sempre o mistério do fundo tão certo como o sono de mistério da superfície,
Sempre isto ou sempre outra coisa ou nem uma coisa nem outra.
Mas um homem entrou na Tabacaria (para comprar tabaco?)
E a realidade plausível cai de repente em cima de mim.
Semiergo-me enérgico, convencido, humano,
E vou tencionar escrever estes versos em que digo o contrário.
Acendo um cigarro ao pensar em escrevê-los
E saboreio no cigarro a libertação de todos os pensamentos.
Sigo o fumo como uma rota própria,
E gozo, num momento sensitivo e competente,
A libertação de todas as especulações
E a consciência de que a metafísica é uma consequência de estar mal disposto.
Depois deito-me para trás na cadeira
E continuo fumando.
Enquanto o Destino mo conceder, continuarei fumando.
(Se eu casasse com a filha da minha lavadeira
Talvez fosse feliz.)
Visto isto, levanto-me da cadeira. Vou à janela.
O homem saiu da Tabacaria (metendo troco na algibeira das calças?).
Ah, conheço-o; é o Esteves sem metafísica.
(O Dono da Tabacaria chegou à porta.)
Como por um instinto divino o Esteves voltou-se e viu-me.
Acenou-me adeus, gritei-lhe Adeus ó Esteves!, e o universo
Reconstruiu-se-me sem ideal nem esperança, e o Dono da Tabacaria sorriu.
- Álvaro de Campos, "Tabacaria"
15-1-1928

segunda-feira, 25 de maio de 2015

Sobre o que viemos fazer aqui

Passou dias a duvidar
Tardes perdidas a procurar
Por que não notou?
O que estava bem na sua frente.

Corre logo que atrás vem gente
Se ficar o bicho pode pegar!
Se eu fosse você...
Não ia olhar pra trás, eu não ia olhar...

SONHA, pra gente se encontrar
Tudo vai ser do jeito que a gente imaginar
Então venha, pra gente SONHAR
E construir um bom caminho pra trilhar.

Eu não sei você, mas eu prefiro prevenir
Ainda restam dúvidas.
Sobre o que viemos fazer aqui.

Pra que procurar outro alguém?
Se a vida vai me fazer voltar.
Pedi ao vento pra me guiar
E fui parar no seu olhar.

SONHA, pra gente se encontrar
Tudo vai ser do jeito que a gente imaginar
Então venha, pra gente SONHAR
E descobrir um bom caminho pra trilhar.

terça-feira, 12 de maio de 2015

SIGO!

Por vezes não soube mais por onde seguir
Já reli tudo que sinto aqui
Ler a ti é como ler a mim
Fecho os olhos para saber ao sentir

Eu não quero ser o dono da verdade
Eu não quero que forçado seja
A verdade é que eu sou assim
Te apresento o meu furacão

Tentando impressionar. Não bastou.
Tentando deixar rolar. Não bastou.
Tentando extravasar. Não bastou.
Tentando não me importar.

Foi o que restou.

E sigo. Cabeça Erguida.
Insisto. Mente Evoluída.

quinta-feira, 9 de abril de 2015

Deusa do Alvorecer, Aurora.

Escureceu, escrevi entre as linhas tortas do meu corpo
Angustiou, absorveu as mais tristes lembranças
Deu voz ao coração e assim não se sentiu mais morto
Respirou, absorveu as mais lindas esperanças

Clareou, o alvorecer trouxe um novo amanhã
Deusa dos meus dias, minha tão querida Aurora
Como pude esquecer? Estava ali o tempo todo, meu divã.
Da invenção a re-invenção, é chegada a hora.

Hora essa de ser feliz
Como quem diz:
Tenho sorte de Viver!

Levantei, minha bela Flor de Liz
Observei pela janela, a vida desenhada com giz
Tenho sorte do meu amor me fazer crescer!